Por Jean Campos, Diretor Criativo da MUVA
Por muito tempo, produzir conteúdo com qualidade estética e narrativa foi um privilégio restrito a poucos. O mercado publicitário e audiovisual esteve nas mãos de grandes agências, produtoras e marcas com alto poder de investimento. Essa hegemonia criativa era sustentada por estruturas caras, equipes numerosas e tecnologias de ponta, criando uma espécie de “pedágio visual” que impedia a entrada de criadores independentes. No entanto, a ascensão da inteligência artificial generativa vem provocando uma ruptura inédita. De acordo com dados do Relatório de Segurança da IA de 2024, o uso dessas ferramentas cresceu mais de 600% em 2023 apenas nas áreas de publicidade e marketing. Plataformas como Midjourney, ChatGPT, Runway e Pika estão permitindo que ideias antes inviáveis se tornem realidade com qualidade e eficiência, mesmo em ambientes com baixo orçamento.
Mais do que uma tendência tecnológica, o uso de IA no processo criativo revela um ponto cego da indústria: a desigualdade de acesso não era fruto da falta de talento, mas da ausência de ferramentas acessíveis. No Brasil, essa realidade já começa a se transformar. Estúdios independentes e marcas emergentes estão utilizando inteligência artificial para gerar conceitos visuais completos, com cenários, personagens e narrativas, em produções que anteriormente dependeriam de recursos altamente custosos.
Uma reportagem publicada pelo portal Meio & Mensagem em abril de 2024 ilustra esse movimento com clareza, mostrando como produtoras como O2 Filmes e Future Studios já incorporam IA em etapas fundamentais de suas produções. O resultado é a redução de custos, otimização de tempo e manutenção do padrão estético esperado. A barreira de entrada está sendo superada, e, junto com ela, desaparece o mito de que apenas grandes investimentos garantem resultados impactantes. Além disso, conteúdos com estética pensada desde o início para IA já apresentam desempenho até 2,4 vezes superior no TikTok, sinalizando a receptividade do público a essa nova linguagem visual.
Essa transformação não está apenas no uso das tecnologias emergentes, mas principalmente no entendimento estratégico de seu potencial. A inteligência artificial, por si só, não gera ideias relevantes. O verdadeiro diferencial está na qualidade do que é entregue à ferramenta, na curadoria e na direção criativa que orientam o processo. Segundo a pesquisa TIC Empresas 2023, do Cetic.br, 20% das empresas brasileiras já utilizam IA, e mais de 70% pretendem investir na tecnologia nos próximos anos. No entanto, o que realmente diferencia quem se destaca é a capacidade de transformar essa tecnologia em valor criativo, preservando identidade, propósito e consistência. Ter acesso à IA tornou-se relativamente simples, mas saber utilizá-la de forma inteligente e estratégica é o que define os protagonistas desse novo cenário.
É extremamente positivo perceber que a inteligência artificial está democratizando a produção de conteúdo. O que antes exigia câmeras sofisticadas, processos de pós-produção complexos e estruturas robustas agora pode ser realizado por pequenos empreendedores e criadores independentes, desde que com uma abordagem criativa e estratégica. Para que essa transformação tenha impacto real e duradouro, é fundamental investir na formação de profissionais capazes de unir criatividade, visão estética e domínio técnico. O futuro da criação está na inteligência aplicada ao uso da tecnologia. Mais do que a ferramenta em si, o que faz a diferença é quem a opera com sensibilidade, propósito e direção.
