A COP30 será, inevitavelmente, alvo de hacktivistas, criminosos e até atores estatais que buscam vantagem política, econômica ou simbólica.
Rafael Oneda – diretor de Tecnologia da Approach Tech.
Em novembro de 2025, Belém deixará de ser apenas o portal da Amazônia para se tornar também o epicentro de uma das maiores operações de segurança cibernética já realizadas no Brasil. A cibersegurança, geralmente vista como um tema técnico de bastidores, assumirá papel central — não apenas para garantir o funcionamento da conferência, mas para demonstrar a maturidade tecnológica e estratégica do país.
Megaeventos desse porte são, historicamente, alvos críticos de ataques digitais. Em Tóquio-2020, por exemplo, o centro de operações de segurança bloqueou 450 milhões de eventos maliciosos sem impacto operacional — um recorde global. Já em PyeongChang-2018, o malware Olympic Destroyer derrubou sistemas na cerimônia de abertura, com técnicas de false flag que confundiram analistas por meses. No G20 de 2011, uma campanha de spear-phishing comprometeu cerca de 150 máquinas do Ministério da Fazenda francês, visando documentos sigilosos. E, mais recentemente, nos Jogos de Paris-2024, a ameaça foi além do digital: a desinformação se tornou uma arma cibernética, com campanhas coordenadas — inclusive deepfakes — destinadas a minar a credibilidade do evento, conforme documentou a Microsoft.
O Brasil, ciente desse cenário, vem se preparando. Belém transformou-se em um verdadeiro laboratório de defesa cibernética. O Exercício Guardião Cibernético 7.0, realizado em setembro de 2025, foi o maior treinamento de ciberdefesa do hemisfério sul, reunindo mais de 2 mil participantes de 160 instituições públicas e privadas. As simulações envolveram ataques a sistemas de energia, transportes, comunicações e saúde — setores cuja interrupção teria impacto direto sobre a COP30.
Esses exercícios vão além da formalidade: reconhecem que, em 2025, um ataque digital pode ser tão disruptivo quanto um atentado físico. E, inevitavelmente, a COP30 estará na mira de hacktivistas, grupos criminosos e até atores estatais, interessados em obter vantagens políticas, econômicas ou simbólicas.
Entretanto, o histórico brasileiro em grandes eventos traz uma lição importante: a pressa é inimiga da continuidade. Durante os Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil criou um dos centros de comando digital mais avançados do mundo. Pouco tempo depois, a estrutura foi desmobilizada e boa parte do conhecimento técnico se perdeu. O risco agora é repetir o erro — desperdiçar a oportunidade de consolidar um legado tecnológico permanente.
A cibersegurança não se sustenta apenas com sensores, firewalls e infraestrutura, mas com continuidade institucional, aprendizado e formação de profissionais. Os cursos de capacitação técnica promovidos pelo Governo do Pará para servidores e estudantes são passos importantes, mas é fundamental garantir que, após o evento, essas pessoas tenham espaços para aplicar e expandir seus conhecimentos.
A COP30 será, sem dúvida, um marco. Mas o verdadeiro legado não estará apenas em proteger o evento — e sim em manter viva a cooperação entre instituições civis, militares e privadas, transformando o aprendizado em política pública permanente.
A continuidade dessa cooperação é vital num mundo em que ataques digitais podem causar danos tão severos quanto os físicos. O que for aprendido em Belém deve servir de alicerce para uma cultura nacional de resiliência cibernética, baseada em vigilância constante, resposta rápida e colaboração interinstitucional.
O legado da COP30 pode, portanto, ir muito além da conferência: deixar o Brasil mais preparado, integrado e resiliente diante das ameaças digitais globais.
